Natal pode ficar mais quente com novo Plano Diretor, afirma especialista em meio ambiente

por , publicado em 29.abr.22

Nova versão do projeto prioriza mercado imobiliário e deixa em segundo plano futuros impactos climáticos na região 

 

Por Luanna Karen, Marcella Queiroz e Thainá Trajano

 

Imagem da praia de Ponta Negra

Mar de Ponta Negra, com vista para o Morro do Careca.  Foto: Marcella Queiroz

 

O projeto de revisão do Plano Diretor, finalizado no dia 23 de dezembro, foi aprovado pela Câmara Municipal após intensos debates e ainda aguarda sanção do prefeito Álvaro Dias. No entanto, algumas problemáticas podem ser identificadas no projeto, como a autorização para construir prédios mais altos na cidade, incluindo construções à beira-mar, e a redução de algumas áreas de proteção ambiental.

Ao todo, foram 263 emendas e as insatisfações com o Plano Diretor vão desde não saber exatamente do que se trata o projeto, devido ao grande volume de modificações sem discussões prévias, até preocupações com as futuras condições de vida da população.

“Com prédios mais altos, uma cidade que já é quente vai ficar mais quente ainda, porque o que ameniza o calor aqui é o vento e, com tantos prédios em frente ao mar, vai prejudicar a cidade e os cidadãos”, relatou Louise Chacon, 19 anos, militante da Unidade Popular.

Infográfico Ilhas de Calor

Como se dá o fenômeno climático que acontece nas cidades com elevado grau de urbanização.
Foto: Luanna Karen

 

Essa situação pode ser entendida a partir do fenômeno climático “ilhas de calor”. “As ilhas de calor correspondem a áreas que são mais quentes que seu entorno e isso acontece quando tem uma área urbana de 10 a 12 graus de diferença entre o centro e a periferia. Em Natal, esse processo já vem se intensificando”, explicou Márcio Steve, 43 anos, professor de Geografia e especialista em meio ambiente e desenvolvimento.

“No Plano Diretor de Natal, estão mudando a altitude dos edifícios, podendo fazer com que as construções tenham uma maior envergadura. Isso pode tornar o clima mais quente, porque quando essa barreira vertical passar a existir com uma maior altura, irá influenciar diretamente na entrada e circulação das correntes de ar”, concluiu o professor Steve.

 

Principais modificações e impactos

 

Atualmente, o limite de altura dos prédios de Natal é de 90 metros. Com o Plano Diretor, o limite passa para 140 metros em partes da cidade, incluindo o entorno do Parque das Dunas, segunda maior reserva de Mata Atlântica do Brasil. A partir dessa mudança, também poderão ser criadas mais obras altas nas praias, deixando-as menos atraentes para turistas, e dificultando a ventilação da cidade.

É o que afirma o arquiteto e urbanista Edvaldo Mendes Júnior, 23 anos, que ficou preocupado com a associação de prédios altos ao desenvolvimento, além das comparações com cidades como Fortaleza, Recife e Balneário Camboriú. Também alertou sobre o desejo dos vereadores em aumentar os coeficientes de aproveitamento em zonas costeiras e em ZPAs (Zonas de Proteção Ambiental). 

“É irônico pensarmos que simples prédios trarão desenvolvimento à nossa cidade, quando nossas orlas ainda têm uma infraestrutura precária e pouco atrativa, e quando nosso sistema de transporte público ainda é tão ineficiente e insatisfatório. As normas menos restritivas propostas no novo Plano Diretor parecem estar mais preocupadas em ceder à pressão imposta pelo mercado imobiliário, do que com a efetiva modernização da cidade, a qual envolve uma série de outras políticas urbanas e ambientais”, afirmou Edvaldo.

Em entrevista ao Bom Dia RN, o prefeito Álvaro Dias afirmou que pretende sancionar o projeto de lei. Quando questionado sobre os impactos ambientais, devido à possibilidade de construções de edifícios na orla urbana, o gestor municipal declarou: “em Areia Preta, a gente vê uma praia moderna, com prédios, infraestrutura urbana diferente. A 50 metros, você chega na Praia dos Artistas, na Praia do Meio e do Forte, é uma orla sem edifícios, despovoada, abandonada, esquecida, que agora vai mudar”.