Cidade apresenta problemas em transportes coletivos, por aplicativos e bicicletas
Apesar de ser um serviço essencial, o ônibus coletivo é ineficiente e frustra população que depende dele para deslocamentos diários. Também não há espaços para outras formas de transportes.
Por: Amanda Macedo, Bala e Geraldo Cordeiro
O transporte público no Brasil é considerado serviço essencial por lei, assim como abastecimento de água, distribuição de energia elétrica, a limpeza urbana ou saneamento básico, portanto é de responsabilidade do Estado prover este serviço. Isto não quer dizer que este deva ser obrigatoriamente fornecido pelo estado. O estado pode prestar este serviço de duas maneiras: de forma direta ou indireta.
Na prestação direta, o próprio estado presta este serviço, normalmente por meio de uma empresa pública. Em Nova York e Paris, o serviço de transporte coletivo urbano é feito por uma empresa do estado. No Brasil, ainda existe algumas cidades em que a prestação do serviço ocorre diretamente pelo setor público, sendo o caso das cidades que operam através da CBTU (Companhia Brasileira de Trens Urbanos), em Natal, João Pessoa, Recife, Maceió e Belo Horizonte.
Já de modo indireto, o estado usa uma concessão ou permissão pública. Em Buenos Aires ou Tóquio, o serviço é concedido para empresas privadas. Este também é o modelo mais adotado no Brasil. Mas, o fato de haver uma concessão deste serviço para empresas privadas não retira a responsabilidade do estado, tendo a obrigação de fiscalizar estas empresas para que seja prestado um serviço de qualidade para a população. Mas por que o transporte público no Brasil em geral não representa a qualidade almejada pela população?
Buscando responder esta pergunta, veremos um pouco como funciona este serviço em Natal/RN, onde o modelo adotado em relação aos ônibus é o de concessão pública, sendo prestado por empresas privadas. A secretaria que tem a competência de fiscalizar o transporte público de Natal é a STTU (Secretaria Municipal de Mobilidade Urbana), onde constam, atualmente, seis empresas com concessão de 80 linhas de ônibus em Natal, sendo elas: Guanabara, N. Sra. da Conceição, Cidade do Natal, Reunidas, Santa Maria e Transflor (Via Sul).
Em 2015 e 2017, foram os anos em que houve propostas para discutir o transporte público foram enviados para a Câmara de Natal. O ano de 2015 recebeu 140 emendas e o projeto foi inviabilizado economicamente. A discussão de 2017 culminou na devolução do projeto para a Prefeitura de Natal em 2019. Porém, em virtude da pandemia de COVID-19, esteve parado, aguardando que a Comissão de Transportes da Câmara veja junto à STTU a situação deste adiamento.
O problema se agravou durante a pandemia de COVID-19, pois sem licitação e sem contrato, as empresas de ônibus têm a liberdade de decidirem, inclusive com a devolução de linhas essenciais, por julgarem não terem viabilidade financeira em mantê-las. E isso aconteceu. Houve a devolução de 23 linhas para a administração pública de Natal, no início da pandemia, incluindo a circular que dava passe livre para estudantes da UFRN.
Os passageiros deste sistema apontam problemas, como superlotação e sucateamento das frotas, mas, há anos, o processo de uma nova licitação se arrasta, havendo uma promessa da STTU para o primeiro trimestre de 2022, mas ainda não há edital aberto para tal.
As duas últimas licitações não tiveram empresas interessadas, sendo declaradas como desertas pela STTU em 2017.
O Sistema de Transporte Público de Passageiros por Ônibus – STPPO do município do Natal possui dois sindicatos, uma para os empregados do serviço (SINTRO/RN – Sindicato dos Trabalhadores e Transportadores Rodoviários do Rio Grande do Norte) e outro para as empresas (SETURN – Sindicato das Empresas de Transportes Urbanos de Natal RN). O SINTRO/RN, visa garantir os direitos dos trabalhadores dentro de acordos trabalhistas validados. A SETURN, além de representar legalmente as empresas permissionárias, também é responsável pela implantação e gerenciamento do sistema Natal Card de bilhetagem eletrônica.
Desde então, com a situação atual, sem contrato vigente e sem licitação, vê-se mais greves com disputas entre o sindicato patronal (SETURN) e o sindicato dos empregados (SINTRO/RN) serem decididas nos tribunais.
Enquanto isso, os passageiros destas empresas ficam amontoados dentro de ônibus superlotados, principalmente no início e no fim dos horários comerciais, em ônibus que não ofertam o conforto necessário, e com estas disputas, a paralisação de parte das linhas agravam a situação que já à beira do caos, principalmente a retomada dos serviços presenciais.
As ciclovias disputam espaço com corredor de ônibus, em Natal
Em descontentamento com o transporte coletivo, tem surgido também o aumento de pessoas que têm aderido à deslocamento com bicicletas. De acordo com a ACIRN (Associação dos Ciclistas do RN), a capital Natal conta com um número de aproximadamente 10 mil ciclistas que usam a bicicleta no seu dia-a-dia. Apesar do grande número de usuários, a cidade conta apenas com aproximadamente 100 km de ciclovias.
Lançado em 2011 o plano cicloviário de Natal tem como objetivo garantir um deslocamento com segurança feitos pelos usuários de bicicletas da cidade, além de oferecer ligação desse com outros meios de transportes.
Ciclista na capital potiguar, Lucas Allen, conta-nos sobre as dificuldades de ser usuário de bicicleta: “Natal é uma cidade que não foi pensada para bicicletas ou qualquer outro tipo de transporte que não seja carro. É uma cidade pensada para carros, é uma cidade que exclui qualquer pessoa que tenta ter uma forma alternativa de transporte. Então, você se coloca num ambiente hostil e que claramente não quer você ali. Mas também é um ato de resistência: você consegue chegar a lugares com suas próprias pernas usando o seu próprio impulso.”
Em Natal é possível ver ciclovias sendo dividida com ônibus. Aproximadamente, 23 km de ciclovias se encontram nessa modalidade, assim como, aproximadamente, 14 km são de ciclovias compartilhadas com pedestres.
Lucas Allen também vê problemas na divisão da ciclovia. “Natal deveria ter mais ciclovias, mas antes disso eles deveriam consultar os ciclistas. É um absurdo ter que dividir uma faixa com ônibus, que quase sempre está com pressa e acaba gerando uma ameaça ao ciclista.”
Transporte por aplicativo em Natal
Desde que o serviço do transporte por aplicativos chegou na capital, no ano de 2016, o número de usuários foi se expandindo e, assim, surgiu a necessidade da adequação dos motoristas às novas exigências para melhorar a experiência e qualidade do serviço. Sancionada pelo prefeito de Natal, Álvaro Dias (MDB), a lei que regulamenta as atividades dos aplicativos de transporte de passageiros na capital potiguar foi publicada no Diário Oficial do Município em junho de 2019, as novas regras implementadas incluem realizar um curso e novas adaptações dentro do veículo, como a presença de pelo menos 4 portas, capacidade máxima para 7 passageiros e ar-condicionado.
A implementação do transporte por aplicativos como Uber, 99 Pop e Melev causou polêmica em várias cidades do país a princípio. Em Natal, o Sindicato dos Condutores de Táxis do RN se contrapôs também aos aplicativos, declarando que o funcionamento do serviço em Natal significava uma “concorrência desleal”. Mas já para o usuário Ewerton Moura, o transporte por aplicativo trouxe grandes benefícios à população: “teve uma mudança positiva porque a gente pode pedir esse tipo de transporte em qualquer lugar e quando quiser e ainda pagar um preço mais acessível que um táxi por exemplo”, ressalta o estudante de arquitetura.
No entanto, há outra questão que precisa ainda ser mais discutira, que diz respeito à insegurança. Saindo de casa diariamente, os motoristas de aplicativos na cidade de Natal e da Região Metropolitana convivem com outro risco, que vão além das medidas protetivas sanitárias, nesse momento: a exposição à violência nas corridas.
Embora as empresas de mobilidade tenham cumprido efetivamente um importante papel na cidade, o foco ainda é em otimizar as funcionalidades para os usuários que ainda apontam falhas no serviço, principalmente aos diversos casos de violência, assaltos e sequestros ocorridos nos últimos meses.
O morador do bairro Lagoa Nova, José Arthur, utiliza o serviço desde que chegou a cidade. “A rotina ficou mais fácil, Sair e voltar para casa em qualquer horário, sem preocupação com as linhas de ônibus, é bem melhor”, disse. Mesmo assim, o engenheiro de software aponta o medo: “muitos motoristas são expostos a pessoas mal intencionadas, já que os aplicativos priorizam o lucro e a facilidade do usuário. Infelizmente, a cidade é muito perigosa.”, declara.
A fim de não entrar nas estatísticas da violência, os motoristas cadastrados têm adotado medidas extras e rotas específicas para evitar situações perigosas, muitas vezes, optando por cancelar a viagem. Para o embalador, Ademar Silva, esse tipo de situação acaba prejudicando os passageiros pois ao cancelar a corrida, “o usuário corre o risco de se atrasar e acabar se frustrando”.
Os principais aplicativos que atuam na cidade criaram ferramentas onde há possibilidade de compartilhamento de rota e um botão que liga automaticamente para a polícia. Além disso, a Secretaria de Segurança Pública fornece dados para um mapeamento de áreas de risco, oferecendo a possibilidade do trabalhador optar por realizar a corrida ou não.