Manutenção das Políticas Públicas de Educação: desafios para a próxima gestão
Retorno do papel coordenador do governo federal é apontado como prioridade para cenário do aprendizado no Brasil
Após quatro anos de uma gestão atravessada por ameaças ao aprendizado, como a recente proposta de corte de mais de R$ 1 bilhão ao programa “Educação Básica de Qualidade” em 2023, a manutenção das políticas públicas de educação é um dos pontos que perpassam as expectativas para o governo Lula (PT). Na avaliação de Sandra Gomes, cientista política e professora no Instituto de Políticas Públicas (IPP) da UFRN, o principal desafio a ser rompido nesse caminho é encontrar propostas com foco na recuperação do aprendizado.
Para isso, seja na esfera estadual, municipal, ou federal, um passo crucial é a realização de diagnósticos e mapeamentos para entender quais os atuais ‘gargalos’ da aprendizagem e propor soluções. Em relação à gestão federal, mais precisamente, a professora observa que a maior dificuldade reside na retomada do papel de coordenação das políticas públicas nacionais pelo Ministério da Educação (MEC).
“Durante o governo Bolsonaro foi a primeira vez em que não houve iniciativas colaborativas de apoio e orientação para com os estados e municípios, que atendem a vasta maioria do aluno da educação básica, sobre como deveriam lidar com a situação da pandemia. As escolas foram as mais afetadas em termos de fechamento e observamos algo inédito: a ausência do papel coordenador, cooperativo e indutor do governo federal que antes tinha estado presente em diferentes governos tanto de esquerda quanto de direita”, observa Sandra Gomes.
Disparidades no aprendizado
Dessa gestão incipiente na educação, várias nuances merecem ser avaliadas, especialmente, a correlação entre a aprendizagem e os contextos sociais ao longo da pandemia. Embora estudantes de classe média tenham enfrentado problemas na aprendizagem ao longo desse período, segundo a docente, eles não se equiparam aos vivenciados pelo alunado socioeconomicamente vulnerável. Isso, continua, revela o aprofundamento de uma entrave sempre permanente: as desigualdades educacionais.
Considerando esse aspecto, ressalta Sandra Gomes, é preciso analisar os indicadores educacionais em conjunto com a situação enfrentada pelo corpo estudantil das escolas. “Lá numa rede municipal do interior do Rio Grande do Norte em que se atendem alunos quilombolas, ou que vivem no campo, as condições e os desafios para ensinar são maiores. Nós temos que tentar trazer isso para o debate público”, complementa.
Dentre os problemas que perpassam esse fenômeno, estão os acentuados índices de evasão escolar ao longo da pandemia. Por trás dessas estatísticas, os grupos mais afetados agregam os estudantes pobres, negros e residentes das áreas rurais. Para a cientista política, nesse sentido, fomentar o retorno das crianças que costumavam frequentar a escola também se projeta como um dos principais desafios no próximo governo.
E, se por um lado há a necessidade do resgate, por outro, a manutenção do funcionamento das escolas é peça chave para viabilizar esse objetivo.
“O que a gente tem visto muito e já apareceu como prioridade da equipe de transição do governo Lula é a recomposição dos valores para merenda escolar, que está previsto no Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE)”, destaca Sandra Gomes.
Isso porque, para além de espaço de aprendizagem, a escola é para muitos alunos o lugar onde encontram a única alimentação adequada ao longo do dia. Segundo a docente, quando a escola oferta, por exemplo, ‘bolacha com suco em pó’, como foi relatado em uma escola do Sertão baiano e outras localidades, ela não está cumprindo o papel central da alimentação escolar no desenvolvimento estudantil. Consequentemente, os alunos têm eixos como o aprendizado e os aspectos socioemocionais comprometidos.
Apesar do foco da equipe de transição no repasse de verbas para a merenda, Sandra Gomes adverte que dificilmente a próxima gestão vai conseguir encaminhar um aporte significativo para a educação em 2023. Isso porque outras prioridades sociais estão sendo destacadas, tais como o reajuste do auxílio brasil para R$ 600, aumento do salário mínimo de 1,3% ou 1,4% acima da inflação e recursos para saúde.