Copa ou movimento político? Ascensão e queda do traje verde-amarelo

por , publicado em 28.nov.22

A história e trajetória da camisa da Seleção Brasileira de Futebol, como símbolo de grandeza no esporte ou como item de manifestação política.

Por Adsson Santos, Ana Gabriela, Flávio Samuel e Heitor Queiroz

As várias “amarelinhas” do Brasil. Foto de Gabo Morales e Lucas Lima, do UOL TAB

A camisa amarelinha sempre foi um símbolo que ajudou na construção da identidade do Brasil, de um país vencedor, capaz de mostrar sua grandeza ao mundo, principalmente após as diversas conquistas no futebol, com a utilização da camiseta.

Porém, diferente do que muitos imaginam, o primeiro uniforme da Seleção Brasileira de Futebol era inteiramente branco, com pequenos detalhes azuis nas mangas, e foi criado em 1914. Foi utilizado até 1950, na derrota para o Uruguai em casa, no que ficou conhecido como Maracanaço.

A derrota deu, ou devolveu, ao Brasil, o que o jornalista Nelson Rodrigues chamava como “síndrome de vira-lata”. Havíamos nascido para perder e teríamos que aceitar nosso lugar comum nas prateleiras de competições mundiais.

Isso mudou com a introdução do amarelo, o qual luz ao futebol brasileiro. O responsável por essa iluminação foi o escritor gaúcho Aldyr Schlee, que tinha 18 anos em 1953 quando venceu 201 candidatos em um concurso do jornal carioca “Correio da Manhã” para a escolha do novo uniforme da seleção brasileira, que entrou em campo pela primeira vez em janeiro do ano seguinte.

O primeiro título mundial do Brasil, entretanto, não foi com a cor amarela, e uma inspiração dos céus ajudaria o Brasil a erguer a Jules Rimet pela primeira vez. Em 1958, faltando dois dias para a grande final contra a dona da casa Suécia, um sorteio definiu que os anfitriões usariam o uniforme amarelo, para desespero da delegação brasileira. Sem possuir segundo terno, o medo e a superstição tomaram de conta, após o maracanazo em 1950 jogar de branco mais uma final seria um pesadelo. Do céu veio a solução: o chefe da delegação, Paulo Machado de Carvalho, foi ao seu quarto e aos pés da imagem de Nossa Senhora Aparecida teve uma brilhante ideia, o Brasil jogaria de azul dois dias depois em Estocolmo. E deu mais que certo, de virada o Brasil venceu os suecos por 5×2, colocando o futebol canarinho no lugar mais alto do futebol.

Essa vitória na Copa da Suécia, a consagração de Pelé como “Rei do futebol” e a aparição de uma nova forma de jogar futebol que privilegiava o improviso e o drible, em detrimento de conceitos táticos, mostrava ao mundo que a seleção brasileira ditaria os padrões e conceitos do jogo a partir dali. A euforia voltava para o povo brasileiro. Para os supersticiosos, a vitória aconteceu por conta da camisa amarela, que foi adotada a  partir de então e que foi usada em todas as partidas da copa, exceto na final.

Símbolo da seleção a partir de então, a camisa amarela passou rapidamente a ser sinônimo de orgulho para os brasileiros, especialmente após os quatro outros campeonatos mundiais, de 1962,1970,1994 e 2002.

A amarelinha e o espectro político

Entretanto, nos últimos anos a alegria de vestir a tão benquista camisa da Seleção Brasileira perdeu seu brilho após onda de patriotismo e fanatismo inflamarem o movimento neofascista no Brasil. Desde 2017 em sua campanha à presidência, Jair Bolsonaro e seus eleitores tomaram para si a camisa como fardamento, distanciando seus opositores do antigo afeto pela vestimenta, tornando a torcida na Copa de 2018 um momento de vergonha e confusão para muitos. Porém, durante a campanha presidencial seguinte, em 2022, parte da oposição ao governo antidemocrático se viu na obrigação de tomar o símbolo nacional da camisa da Seleção de volta para a Nação como um todo, tornando ela, aos poucos, novamente desejada pela população.

Manifestantes bolsonaristas utilizando a camisa da Seleção. Créditos: Minervino Júnior/CB/D.A.Press; retirada do Correio Braziliense

Passado o período eleitoral e com a aproximação da Copa 2022, já é previsto o retorno da Camisa para a população: o mercado já apresenta reação dos consumidores que estão determinados a terem a camisa de volta como símbolo nacional e não mais visto como algo associado ao fascismo. Medindo a temperatura da economia norte riograndense para o período de torcida da Copa, pesquisa feita pelo Fecomércio (Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo do RN) estipula média de consumo em artefatos de 144 reais por consumidor natalense, e média de 125 reais para o torcedor mossoroense. De acordo com relatório da Federação, o número de pessoas que pretendem adquirir produtos relacionados à Seleção Brasileira no Rio Grande do Norte ainda é bem alto, sobretudo na área de vestuário. Em Mossoró, cerca de 46% dos que pretendem acompanhar o torneio, pretendem também adquirir produtos e, em Natal, esse número chega a 62,1%.

Gráficos de intenção de compras de consumidores para a Copa do Mundo 2022 em Natal e Mossoró, respectivamente. Retirado dos relatórios da Fecomércio RN.

Também na tentativa de dissociar a imagem da camisa com a política do país, a Confederação Brasileira de Futebol (CBF), vendo que os movimentos políticos instigados pelo presidente afastam grande parte da população dos produtos da Seleção, pretende iniciar uma nova campanha de divulgação do uniforme deste ano. A ideia é mostrar que todos os brasileiros podem se sentir bem vestindo a amarelinha. A peça publicitária foi anunciada pouco antes da convocação oficial para a Copa no Qatar, na última segunda-feira, 7 de novembro, e está prevista para ser veiculada até o final da competição, na televisão e internet.